EDITORIAL: O retorno de Linkin Park é um desrespeito à figura de Chester Bennington e empurra o legado da banda para o ralo

Linkin Park para a Billboard (foto por: James Minchin III)

Às vezes, as coisas precisam de um fim para se tornarem eternas. O retorno de Linkin Park é um desrespeito à figura de Chester Bennington e empurra o legado da banda para o ralo. 

Após 7 anos da morte do vocalista Chester Bennington, a banda de rock alternativo estadunidense Linkin Park retorna reformulada caminhando no fio da navalha.

A morte trágica de Chester Bennington em julho de 2017 foi o maior ato de profunda tristeza que acometeu os fãs da banda em toda a sua história. A voz com um fry excessivo potente e agressivo tornou as músicas da banda atemporais e além de ser considerado um rock alternativo melancólico, criou-se hinos populares como “Numb”, “In The End”, “Papercut”, “Somewhere I Belong”, “Faint”, “BURN IT DOWN”, entre tantos outros.

Bennington sofria de depressão e isso refletiu nas composições dos discos da banda, que sempre abordou a tristeza, desamparo, abandono, desafeto, angústia e rancor de maneira alta e gritante, quase como um desabafo, causa principal da banda de rock ter sido a mais popular do século 21 para o gênero. Apesar de análises mistas da crítica especializada, seus discos geraram clássicos para o gênero, reinventou a categoria e modernizou o que o rock pode ser, o vinculando ao hip-hop, criando talvez um dos maiores crossovers da indústria musical com Jay-Z em “Collision Course” (2004). Além disso, houve uma mistura com o eletrônico, rap e introduziu-se a sintetização em excesso de instrumentos, efeitos sonoros, que acabou gerando uma identidade única ao grupo.

O álbum de estreia da banda, “Hybrid Theory” (2000) teve um de seus aniversários de 20 anos mais simbólicos dos últimos tempos de um disco inicialmente mal-recebido na data, que com o tempo houve uma retratação natural de que o projeto havia se tornado único, atemporal e extraordinário. “Meteora” (2003) segue o mesmo caminho.

“Hybrid Theory” foi um blockbuster que ainda havemos de ver para um grupo de rock alternativo estreante. Após 20 anos de seu lançamento, ele tem um acumulado de mais de 30 milhões de unidades vendidas (maior parte deles em vendas puras, sem contagem de streaming), sendo 12 milhões de unidades apenas em seu solo natal, Estados Unidos. O disco de estreia é o mais vendido do século 21 para o gênero de rock e figura entre os mais vendidos de todos os tempos. O clássico se classifica também na lista dos 200 álbuns definitivos do Rock and Roll Hall of Fame.

Linkin Park foi um grupo que obteve poucos discos comparado ao tempo de carreira, mas devido ao sucesso comercial colossal, se sustentou com folga durante os anos em que esteve em hiato. Em 20 anos de carreira, o grupo produziu apenas 7 álbuns de estúdio, considerado pouco para uma banda de sucesso astronômico. Até hoje, questiono como a Warner Music Group não conseguiu sugá-los ao máximo com álbuns recorrentes.

A partir de seu terceiro álbum de estúdio, “Minutes To Midnight” (2007), Linkin Park foi se desvinculando do rock alternativo metalizado para um escorrego no eletrônico com um gosto sutil de pop disfarçado, o que descontentou parte dos fãs e da crítica especializada na data. Isso fez com que eles retornassem às raizes de maneira contemporânea em “A Thousand Suns” (2010) e se rendendo ao EDM apelativo do início dos anos 2010 em “LIVING THINGS” (2012) que nos apresentou uma de suas melhores faixas, “BURN IT DOWN”, que serviu como single para o projeto.

Em “The Hunting Party” (2014), Linkin Park resgatou a energia de seu álbum de estreia de 2000, e é quase unânime entre os fãs a satisfação com o disco. Indo na contramão, “One More Light” (2017) foi mais uma rendição ao pop que desagradou quase a todos, apesar de considerar ser um bom disco, eles quase mudaram o gênero pelo qual se tornaram populares, o que foi considerado uma “traição” pelos seus fãs mais aguerridos e uma “rendição” ao pop que dominou as paradas de sucesso em 2017.

“One More Light” foi lançado em maio de 2017 e a morte de Chester Bennington, vocalista da banda, em julho de 2017 foi o principal motivo pelo abandono dos trâmites comerciais de promoção à era. Desde então, o grupo se recolheu para viver o luto junto com a comunidade que estava devidamente devastada. A indústria musical na data ficou estarrecida com o acontecimento, gerando diversos tributos mundo afora.

Mike Shinoda, integrante da banda, lançou projetos que relatavam sua relação com o luto de Chester, como em “Post Traumatic” (2018). Os demais membros se desconectaram da música por tempo indefinido e a comunidade Soldier (como é chamado os fãs da banda) tentou também seguir em frente enlutados.

Em 2020, houve o aniversário de 20 anos de seu álbum de estreia, “Hybrid Theory”. Como dito supracitadamente neste editorial, o aniversário do disco foi simbólico para o grupo e para toda sua comunidade, onde houve a celebração de Chester e de todo o repertório relevante da banda.

Hoje, 7 anos após o hiato da banda, eles retornam completamente reformulados de surpresa numa edição exclusiva à revista musical estadunidense Billboard. O nome Linkin Park se mantém, porém com dois novos integrantes adicionados: Emily Armstrong como co-vocalista de Mike Shinoda (como era Chester Bennington) e Colin Brittain, baterista e co-produtor que veio para ocupar o lugar de Rob Bourdon, que disse que irá se manter no grupo apenas nos bastidores.

Leia a edição exclusiva do Linkin Park à Billboard aqui (créditos: billboard.com)

Em 5 de setembro de 2024, de surpresa, a banda entrou em uma livestream em seus canais oficiais para anunciar a nova formulação do grupo, seguida da edição exclusiva para a Billboard.

Assista à livestream aqui:

Na livestream que dura 1h21min, a banda introduz oficialmente Emily e Colin à banda, canta seus maiores sucessos e cria uma estratégia de marketing para anunciar seu oitavo álbum de estúdio intitulado “From Zero”, previsto para ser lançado em 15 de novembro de 2024.

Talvez não seja a intenção, mas o que aparenta é que mesmo que eles digam que não, o desrespeito à figura de Chester Bennington é evidente. Linkin Park é em sua essência a voz de Chester, suas vivências e o maior responsável pela identidade da banda. Na transmissão ao vivo de retorno da banda onde introduziu Emily e Colin, foi uma vergonha constrangedora, sendo possível ver inclusive o descontentamento da plateia durante a apresentação. Não desmerecendo Emily Armstrong, nem Colin Brittain, mas a adição deles ao grupo é uma tentativa de emplacar uma imagem repaginada de algo lendário que está fadado ao fracasso desde o primeiro segundo. A recepção à novidade foi mista (como tudo do Linkin Park tem sido) e eles simplesmente empurraram seu legado extraordinário e implacável pelo ralo ao se diminuírem a ponto de fazer com que Bennington fosse apenas um dos capítulos de uma banda que não seria nada sem ele.

O retorno reformulado de Linkin Park teve uma atenção muito alta que irá criar uma expectativa grande e irá ansiar pelo novo disco, mas o caminho não será tão longo. Emily Armstrong é desafinada e tenta imitar a energia e a técnica vocal de Chester que falha diversas vezes, inclusive o single responsável pelo novo álbum, “The Emptiness Machine” soa como uma versão descartada do tédio de Mike Shinoda de qualquer bomba sonora de seus projetos eletrônicos que foram inacabados. Inclusive, soa como se fosse uma continuação de mal gosto de “One More Light” quase como uma desconsideração ao trauma que ficou em relação ao disco.

Às vezes, as coisas precisam de um fim para se tornarem eternas. O retorno de Linkin Park é um desrespeito à figura de Chester Bennington e empurra o legado da banda para o ralo. 

Leia outras linhas editoriais aqui

Deixe um comentário