
Gênero: R&B
Gravadora: Gamma
Lançamento: 26 de setembro de 2025
Com “Here For It All”, Mariah Carey retorna em um disco sobre legado, perda e a arte de permanecer quando a voz já não voa tão alto.
Após 7 anos desde o primoroso e refrescante “Caution” (2018), Mariah Carey retorna com seu 16° álbum de estúdio intitulado “Here For It All”. Desta vez, Carey se projeta fora do período festivo natalino para um projeto novo e que vai te atualizar sobre o que aconteceu desde seu último disco.
Diante de uma carreira numericamente em declínio (com exceção do período de final de ano), Mariah Carey entrou numa fase a partir de “Me. I Am Mariah… The Elusive Chanteuse” (2014) onde sua arte não precisava mais vender, já que seus discos venderam mais de 200 milhões de unidades físicas ao redor do mundo desde sua estreia em 1990.
Dona de uma das maiores vozes da indústria musical que influenciou e ensinou incontáveis artistas a cantarem elevando o padrão, Carey não precisava mais vender para provar algo. Seu legado por si só já era necessário para fazer com que qualquer um ajoelhasse e agradecesse por toda a influência artística e vocal entregue.
Acontece que depois de um dos maiores retornos à música do século com “The Emancipation of Mimi” (2005), pelo qual lhe rendeu a música que definiu a década “We Belong Together”, ter um auge tão colossal novamente era quase impossível, e de fato não ocorreu.
Os discos seguintes venderam expressivamente menos do que The Emancipation, mas a este ponto, não era preciso tentar mostrar ser algo, já que sua voz de cinco oitavas entrava na conversa para intimidar qualquer um. Com a voz no topo de sua tessitura, Mariah chocava e atingia a alma de qualquer um, sendo até hoje um dos discos de mais tirar o fôlego já lançados, mesmo 20 anos depois.
O legado deixado por Carey é incontestável, de fato, porém também há falhas a serem pontuadas. Em 1992, a crítica especializada acusou Mariah de “ser uma artista de estúdio”, duvidando de sua habilidade e capacidade vocal, o que a fez levar para o icônico palco do MTV Unplugged, onde tapou a boca de qualquer um que duvidasse de seu talento vocal.
O impacto de sua voz foi tão inacreditável e intrigante que comparações com a vocalista Whitney Houston foram inevitáveis pela indústria na época, sendo desmontada depois qualquer rivalidade entre as duas no dueto de “I Still Believe” (1999).
De The Elusive Chanteuse em diante, Carey se tornou mãe e agravaram-se os problemas com sua voz. Os nódulos se tornaram um obstáculo mais do que uma bênção, ele era o responsável por estreitar suas cordas vocais e entregar aquelas notas altíssimas entregues em “Emotions” (1991), por exemplo.
Em meio a maus hábitos, como consumo de álcool, desidratação e uso de medicação para controlar transtornos psiquiátricos, sua voz se metaliza, perdeu projeção, estabilidade, agilidade e a indústria não compadeceu ao tecer críticas. A própria Mariah reforçava isso no uso de playbacks, bases e lip-sync em seus shows, tirando toda e qualquer credibilidade. Há uma linha tênue entre um legado a ser imbatível e manter a qualidade a longo prazo.
Enquanto Chanteuse é um disco meio lá e cá, “Caution” é refrescante e um suspiro qualitativo na discografia. No segundo, Carey entende suas limitações e adapta-se para algo contemporâneo e que até atraiu fãs mais jovens ao adotar um som de R&B que conversava com artistas em evidência no gênero na época, como Kehlani, Summer Walker e SZA.
Em “Here For It All”, a história é um pouco mais profunda e possui uma proposta diferente, já que este ano Carey perdeu sua mãe e irmã em datas muito próximas, além do fato de ter embarcado numa jornada de promoção de sua imagem muito exigente.
Em diversas ocasiões, ela mostrou-se desconectada do público e distante e quem não sabia o que estava entendendo o pano de fundo, certamente criticaria, afinal, negócios são negócios, ninguém paga por um show insatisfatório.
Sua voz ficou ainda mais metalizada e meio complicada de desfrutar como o veludo mais caro do mundo em “Daydream” (1995) ou “Butterfly” (1997), mas que ainda terá as técnicas de uma vocalista experiente, mesmo com suas limitações.
For It All contém 11 faixas que juntas possuem uma duração de 39 minutos. Junta-se à Mimi na produção do disco The Stereotypes, 9am, N.W.I, Daniel Moore II, Harv e Anderson .Paak. O disco R&B é uma mescla do do gênero entre o late 90’s e o early 2000s que é muito bem produzido em todos os aspectos, sendo o maior gargalo a própria voz de Mariah.
Liricamente, o álbum desvia-se em alguns momentos de dar mais detalhes do que Mimi passou nos últimos anos como na divertidíssima “Sugar Sweet” (colaboração com as artistas Shenseea e Kehlani), mas há momentos que ela entende sua posição de artista com um legado imensurável como em “Mi”, onde ela cita: “eu não me importo se isso não é sobre a Mi / deixe o dinheiro falar primeiro / eu sou a D-I-V-A / essa é a MC”.
O disco é interessante porque ele navega em várias eras e vertentes do R&B como se fosse uma mensagem da proprietária do gênero dizendo: “eu vejo o que vocês estão fazendo e isso é uma homenagem a todos vocês!”.
Apesar de sua voz estar com limitações, ela não deixa de mostrar que é vocalista em “Jesus I Do” (colaboração com o coro vocal gospel The Clark Sisters) e na faixa-título (que por sinal, é a melhor fase da escuta) onde sua voz preenche lacunas com improvisos bem colocados, produção vocal primorosa e mixagem vocal no ponto.
A faixa-título de quase 7 minutos é desnorteante de tantas formas que você precisará se preparar toda vez que for escutá-la.
Com “Here For It All”, Mariah Carey retorna em um disco sobre legado, perda e a arte de permanecer quando a voz já não voa tão alto.
NOTA:

Escute “Here For It All” de Mariah Carey aqui:
