Review: “FRAGMENTADO” de Xamã

Em “FRAGMENTADO”, Xamã vai na contramão do rap estadunidense melodicamente enxuto, mira e acerta em cheio numa obra musical cheia de referências à cultura brasileira com arranjos elegantíssimos com um tom apaixonado.

No último dia 29 de maio, o rapper carioca e fluminense Xamã lançou seu 5° álbum de estúdio intitulado “FRAGMENTADO”, 5 anos após seu último disco, “Zodíaco” (2020). O conceito de estar “fragmentado” no disco de 25 faixas que perduram em uma experiência de 1 hora e 9 minutos é uma resposta direta à inserção do artista no cenário da música comercial brasileira desde seu último projeto.

Envolvido em outros projetos fora da música, como na atuação em “Amor de Mãe” (2019) e “Travessia” (2022), ele foi inserido nacionalmente em uma visão que desviava do cenário do hip-hop e, com isso, foi criando-se uma imagem mainstream que fez com que parte do público pudesse achar que ele estava abandonando suas raízes de jovem da zona oeste do Rio de Janeiro, como ele menciona diversas vezes durante o disco. 

Ao escutar o disco, foi uma surpresa e tanto acompanhar durante toda a hora de experiência um disco recheado de arranjos riquíssimos originados do R&B, jazz, hip-hop e urban feito com tanta maestria. A mixagem é tão bem colocada que eleva ainda mais o processo de escuta do projeto.

Por se tratar de um disco de rap, se você é fã do gênero, certamente se sentirá satisfeito no geral, apesar da avaliação no site de análises por usuários comuns Album of The Year estar atualmente em 6.9/10 até a data de publicação desta análise. 

Como mencionado anteriormente nesta análise, o disco é repleto de arranjos bem orquestrados, mixados e riquíssimos. Melodicamente, não será um problema escutá-lo, pode apostar. Mesmo contendo 25 faixas, todas as faixas são bem produzidas com muita cautela e zelo. Qualquer faixa que você ousar tocar será uma experiência positiva, desde um blues tão original que fará você pensar que ele tem parentesco com B.B. King até um urban obscuro característico de Travis Scott, Future, Lil Wayne e J. Cole. 

Liricamente, a obra possui boas rimas no geral, apesar do flow aparentar estar sempre no mesmo lugar (desconsiderando as participações especiais – que, por sinal, são muitas… falaremos delas nos próximos instantes desta análise). Xamã ganha pontos em demasia simplesmente por não tentar esconder sua rouquidão desafinada como muitos rappers estadunidenses fazem utilizando o artifício do autotune. Nos momentos em que esta ferramenta do Pro Tools é utilizada, parece ter um conceito e um efeito pontual, sem tomar conta da identidade do projeto.

Durante a escuta, você irá se deparar com artistas como Liniker, Milton Nascimento, Agnes Nunes, MC Hariel, Ramon Calixto e até a atriz global Sophie Charlotte. As colaborações, mesmo sendo muitas, são boas adições ao disco e não tira a identidade proposta em nenhum momento.

O dueto em “COISA DE PELE” com a cantora e compositora Duquesa é um dos pontos mais altos que será apresentado a você logo no início, causando uma boa impressão. A discussão nos momentos finais como se fosse uma batalha de rima vai te esboçar um sorriso genuíno. A faixa “LINIKER” é outro ponto positivo dentre as colaborações, onde contém a participação especial da própria cantora Liniker, além do rapper Major RD. O “portuglês” com Agnes Nunes em “JUST LOVE” também faz seu papel interessante dentro do disco. 

Para concluir a parte lírica, o disco é repleto de rimas bem compostas e raramente comete deslizes, como “querem sua alma como Shang Tsung / só não leve em consideração meu Samsung” em “MOSAICO” ou “amor, aquela aeromoça, vou deixar ela ser minha pilota / trago cerveja e ainda lavo louça” em “AEROMOÇA”.

Além disso, as menções ao maior bairro em número de residentes do Brasil, Campo Grande, no Rio de Janeiro, que, por sua vez, também é de onde Xamã veio, é citado diversas dentro do projeto, reforçando a homenagem de onde veio. O tom apaixonado do disco também se dá ao seu relacionamento com a atriz global Sophie Charlotte, também apresentada como participação especial em “FLOR DE MAIO”, uma faixa suave que também vale a sua escuta.

Em “FRAGMENTADO”, Xamã vai na contramão do rap estadunidense melodicamente enxuto, mira e acerta em cheio numa obra musical cheia de referências à cultura brasileira com arranjos elegantíssimos com um tom apaixonado.

NOTA:

Escute “FRAGMENTADO” de Xamã aqui: