
EDITORIAL: A vitória de Taylor Swift em Álbum do Ano é ridícula, Miley Cyrus levou apenas por números e mais uma vez os artistas negros ficaram na sombra da mediocridade de meia dúzia de brancos acomodados da indústria.
Ontem, 4 de fevereiro de 2024, aconteceu a 66ª edição do Grammy Awards, a maior premiação fonográfica do mundo. O show foi realizado na Crypto.com Arena, em Los Angeles, Califórnia, EUA.
A edição deste ano não foi tão diferente com o que estamos acostumados a ver em edições anteriores. Um dos pontos notáveis foi que a falta de um artista estreante como Olivia Rodrigo em 2021 e Billie Eilish em 2019 não balançou e nem dividiu tantos votos na bancada de votantes da Academia de Gravação, o que acabou causando um destaque de figuras já vistas anteriormente nos indicados como o vencedor de Álbum do Ano Jon Batiste, Taylor Swift, Billie Eilish, Olivia Rodrigo, Lana Del Rey, entre outros.
Com o retorno sutil e estrondoso de SZA com “SOS” (2023) e a ascensão belíssima de Victoria Monét com “JAGUAR II” (2023), houve pouco espaço para artistas novos no geral.
A Academia — como sempre —, a depender dos vencedores, move as categorias do show principal para o pré-show, assim como foi feito com Melhor Performance em Dupla/Grupo. No ano passado, onde “Kiss Me More”, colaboração de Doja Cat com SZA — que levou merecidamente a categoria — foi movida para o show principal, pois ambas estavam presentes na premiação. Este ano, a premiação foi movida para o pré-show, onde o prêmio da categoria foi entregue para “Ghost In The Machine”, colaboração de SZA com Phoebe Bridgers de seu álbum “SOS”, que de longe era uma das melhores indicadas.
Em relação aos artistas que se apresentaram no show, tivemos alguns descartáveis como Luke Combs. Não convidaram Victoria Monét, que tem apresentações invejáveis para pisar no palco para uma apresentação, o que nos leva a acreditar que o lobby das gravadoras continuam em peso nos bastidores, indo na contramão do que executivos costumam dizer.
Este ano, as vitórias foram bem distribuídas entre os indicados no campo de subcategorias e categorias mais “específicas”, com SZA levando o prêmio em Melhor Álbum Progressivo de R&B e Melhor Música de R&B, Coco Jones levando Melhor Performance de R&B com “ICU”, Victoria Monét levando Melhor Álbum de R&B com “JAGUAR II” e Tyla levando a categoria de Melhor Performance de Música Africana.
No famoso Big Four, mais conhecido como categorias principais importantes que são: Álbum do Ano, Gravação do Ano, Música do Ano e Artista Revelação, a surpresa foi zero. A vitória de Miley Cyrus em Gravação do Ano foi apenas pelo grande sucesso da viral “Flowers” de seu disco “Endless Summer Vacation” (2023), onde na categoria tínhamos faixas muito melhores como “vampire” de Olivia Rodrigo, o sucesso número #1 nas rádios urbanas dos EUA “On My Mama” de Victoria Monét e a estável “Kill Bill” de SZA, criou um constrangimento qualitativo com a vitória de Miley que inclusive, ganhou seu primeiro gramofone nesta edição. Possa ser que os votantes se intimidaram pelos números estratosféricos da música e não queriam causar nenhuma polêmica votando em indicados que fizeram “menos sucesso”, o que é um vexame.
Em Música do Ano, a vitória foi dada à Billie Eilish com a canção original “What Was I Made For?” para o filme “Barbie” (2023). A música em si encaixa bem na proposta de uma parte do filme, mas para ser levada como a música do ano, é explicitamente escancarado o favoritismo com Billie, e parece mais ser um fascínio insuperável do que ela foi em “WHEN WE ALL FALL ASLEEP, WHERE DO WE GO?” (2019). Faria mais sentido “Flowers” de Miley Cyrus estar aqui ou “Kill Bill” de SZA.
Em Artista Revelação, tivemos a vitória mais merecida de todas desta edição: Victoria Monét. A talentosíssima co-compositora de sucessos como “thank u, next” e “7 rings” de Ariana Grande. Além de levar uma das categorias do Big Four, Monét levou também os prêmios de Melhor Álbum de R&B e Melhor Álbum de Engenharia, Não-Clássico. Monét viveu anos tentando desamarrar o nó que a impedia de se lançar na indústria, mas isso a fez continuar a trabalhar nos bastidores como uma talentosa e sensível compositora, para artistas como Ariana Grande, Diddy Dirty Money, Chloe x Halle e Fifth Harmony. O seu álbum de estreia “JAGUAR II” sofreu um atraso para ser lançado devido ao projeto da cantora de unir dois EPs em um disco só (formando o álbum completo) dar errado. Em agosto de 2023 ela finalmente lançou seu álbum de estreia, e seu single carro-chefe “On My Mama” conseguiu desamarrar o nó que a impedia de ascender. O prestígio dela nesta edição foi o mais merecido de todos, de longe.
Em Álbum do Ano, tivemos o vexame — e possível roubo — com a vitória de Taylor Swift com o medíocre “Midnights” (2023). Esta foi a quarta vez que a artista levou a categoria mais importante da premiação, a tornando a artista que mais venceu essa categoria na história da premiação, onde levou com “Fearless” em 2009, “1989” em 2015, “folklore” em 2020 e agora com “Midnights” (2024). Este é um dos piores discos do repertório de Swift e um dos mais medíocres de 2023.
“1989” e “folklore” podem até ser considerados acertos, mas com “Midnights”, definitivamente não é. Esta categoria era exclusivamente de “SOS” de SZA, um disco que causou uma comoção relacionável no público estadunidense e mundial que produziu o grande sucesso “Kill Bill” e um dos discos mais próximos e tocantes a alma desta década até agora. O álbum de SZA é uma continuação de sua história pessoal relatada inicialmente em “Ctrl” (2017) que relata a batalha que SZA enfrenta por ser uma mulher negra que se torna relacionável para uma parcela gigantesca dos ouvintes, além de ser um disco que conversa diretamente com quem o escuta, o que definitivamente prova que esta categoria deveria ser dela. A vitória de Swift pode mostrar que os votos ficaram divididos entre Jon, SZA e Janelle Monáe, o que acabou causando a liderança de Taylor. Essencialmente, este prêmio não é dela, da mesma forma que “Harry’s House” de Harry Styles não merecia levar no lugar de “RENAISSANCE” de Beyoncé no ano passado.
Só por curiosidade, nenhuma mulher negra venceu a categoria de Álbum do Ano na premiação desde Lauryn Hill em 1999, e não há espaço para alegações como “não teve álbuns bons que merecessem desde então”. Esta é uma leviandade que revela alienação, onde tivemos álbuns como “The Emancipation of Mimi” (2005), “Lemonade” (2016) e “RENAISSANCE” (2022).
Pelas subcategorias, a Academia de Gravação até que cometeu alguns acertos, mas para as categorias principais, foi mais do mesmo, e decepcionante como sempre.